Crítica: The Sopranos – Série Completa (1999 – 2007, de David Chase)




Afiada, implacável e praticamente perfeita, uma das melhores séries de todos os tempos.




Criada por David Chase e produzida pela HBO, The Sopranos (também chamada A Família Soprano no Brasil) teve 6 temporadas e mudou o formato da TV americana e mundial. Seu sucesso impulsionou outras grandes obras, espécies de “filhos”, onde destaca-se a também grandiosa Breaking Bad. Com The Sopranos, passamos a acompanhar a trajetória de uma família italiana mafiosa, figuras sombrias, perversas, defeituosas, mas ironicamente falhas, humanas e cheias de camadas e complexidade. De início é difícil se acostumar a acompanhar a jornada dos “vilões” e todos os horrores que cometem, cujos caminhos levam à traições, mortes e os mais variados crimes. Mas o roteiro, engenhosamente faz-nos apegar aos personagens, porém sem deixar de lembrar que não estamos diante de mocinhos, mas de criminosos e que cedo ou tarde, haverão consequências.




Para não parecer que defende-se o crime, o racismo e o egocentrismo, o time de roteiristas cria uma trama ácida, sarcástica, com momentos tragicômicos, mas nos lembrando constantemente de que ter tal proceder é podridão pura. Mas as atuações e a construção complexa dos personagens e suas narrativas nos forçam a querer continuar vendo onde isso irá parar. O elenco é formidável, de fazer inveja a muito filme. 



James Gandolfini encabeça o protagonista Tony Soprano, o líder da família. Nós temos uma relação de amor e ódio com ele, tamanha sua grandiosidade em cena. Com uma atuação magistral, ele encarna um temperamento explosivo, sempre à flor da pele, sempre nocivo, mas aparentemente sempre bem intencionado com aqueles a quem ama. A mesma mão que mata os inimigos (alguns inocentes), acalenta os amados (alguns odiáveis). Ele transborda sentimentos complexos: um mafioso sanguinário, mas que possui momentos de lucidez, onde tenta-se procurar a paz. Muitas das vezes ele se encontra em uma encruzilhada: está prestes a dar um novo rumo na vida, mas situações extremas o forçam a tomar suas medidas criminosas.


Os diálogos de Tony com sua psicóloga são geniais. Vão das origens da violência, à mais complexa filosofia, passando por teorias da conspiração, até fatos históricos ocorridos na época da série (11 de Setembro, Guerra do Iraque, etc). A psicóloga (muito bem interpretada por Lorraine Bracco) representa nós, o público, que “escuta” (assiste) a história de Tony. Mesmo que ela fique perplexa com toda barbárie, não consegue parar de tratar ele e saber mais deste submundo, fazendo um paralelo com nós assistindo a série. Não conseguimos desgrudar os olhos da jornada de Tony, por mais tortuosa que seja. As terapias de Tony e a psicóloga são o clímax da brilhante construção narrativa da série. Basicamente todos grandes acontecimentos e motivações estão ali presentes, contextualizando a narrativa e o que está por trás deste universo.




Todo o elenco é ótimo em cena. Destaques para o carisma de Steve Van Zandt e Drea de Matteo, esta última inclusive, com uma personagem repleta de vida e sonhos, com um dos desfechos mais agoniantes da série. Michael Imperioli entrega outro personagem complexo, bastante irritante às vezes, mas também com sonhos. É com ele que a série brinca um pouco com a metalinguagem e faz referência ao cinema de máfia. Edie Falco interpreta a esposa de Tony e é outra personagem na qual temos sentimentos dúbios, pois se por vezes sentimos pena dela, por outros momentos as suas motivações soam controversas. 


The Sopranos dispensa sensacionalismo, grandes reviravoltas e outros artifícios. Apesar de uma construção lenta, tudo é natural, como se fosse o cotidiano. Acredite: cada personagem, diálogo e acontecimento levará à um lugar, nem que demore algumas temporadas. Tudo faz sentido, tudo fecha um ciclo e uma trama impecável. E mesmo que sem forçações, existem sim acontecimentos de cair o queixo, mas sempre bem dosados e crus, como a vida é. Há muito, mas muito o que se discutir em The Sopranos, daria aqui um post muito maior do que este ficará. Existe muita ironia em ver que criminosos também tem seus desafios cotidianos, como lutar contra uma doença ou passar por uma crise existencialista. A propósito, a série debate todos assuntos sociais possíveis que se possa imaginar. 



Mas há 3 destaques: as metáforas entre a vida e a morte, a depressão como pano de fundo de vários acontecimentos extremos e uma dura crítica à família tradicional. Sobre este último, note que temos aqui uma família branca, rica, de influência, conservadora e respeitada. Máscaras e mais máscaras. Aos poucos tudo se desconstrói em um emaranhado de podridão e como tudo é superficial, negativo e frágil. É genial, por exemplo, como os mafiosos italianos são machistas, homofóbicos, racistas, religiosos e defensores dos bons costumes, mas essa “defesa” é violenta a ponto de tirar vidas, tornando-os hipócritas o tempo todo. Assim se faz uma dura crítica em como a América como um todo (EUA, Brasil, etc) é hipócrita, defensora de bons costumes, mas sanguinária e perversa, a como tudo pode desmoronar graças a essas redomas de vidro sociais, redomas arranhadas e prestes a quebrar.


Um colosso, uma obra-prima, com um final poético e reflexivo, The Sopranos é uma jornada e tanto. Forte, melancólica e poderosa, entrou fácil como uma das melhores séries que já vi em todos os tempos, talvez a melhor. Bastante atual, muito bem dirigida, roteirizada e atuada, um marco para ser revisto e contemplado, para se levar para a vida. Obrigado HBO.





Título Original: The Sopranos


Diretores: Tim Van Patten, John Patterson, Allen Coulter, Alan Taylor e outros.




Episódios: 86




Duração: aprox. 60 minutos por episódio




Elenco: Dominic Chianese, Edie Falco, James Gandolfini, Jamie-Lynn Sigler, Lorraine Bracco, Michael Imperioli, Steve Van Zandt, Tony Sirico, Al Sapienza, Bokeem Woodbine, Brian Geraghty, Drea de Matteo, Elaine del Valle, J.D. Williams, Jerry Adler, Joe Lisi, John Heard (I), John Ventimiglia, Joseph R. Gannascoli, Matt Servitto, Michael Gaston (I), Michael Rispoli, Mike Epps, Nancy Marchand, Robert Iler, Sharon Angela, Vincent Curatola, Vincent Pastore, Yancey Arias.




Sinopse: Tony Soprano é um típico empresário norte-americano de meia-idade; tem uma esposa responsável e que anda dentro da linha, uma filha não muito obediente, um filho chamado Anthony e uma mãe que se recusa a ir morar em um asilo. Nada fora do normal, não fosse o fato de Tony ser também o chefão de uma outra família; a máfia.




Trailer:








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