Crítica: Especial Sessão de Terapia (2012 – 2019, de Selton Mello)



Em um momento em que fala-se tanto sobre depressão e tantas outras neuroses que destroem nossa saúde mental e parecem cada vez mais comuns no nosso cotidiano, Sessão de Terapia é daquelas séries que são uma prestação de serviço à sociedade, é um abraço, um conforto aos que passam dolorosos dilemas na vida e perderam-se de si dentro dos próprios conflitos.


Essa, que é uma adaptação brasileira da série israelense BeTipul, e que teve remakes em cerca de 30 países, dentre eles os Estados Unidos com In Treatment, só aqui alcançou tanto sucesso ao ponto de chegar à quarta temporada e ainda prendendo, comovendo e nos fazendo esperar ansiosos pelo que vem pela frente.

Roberto D’Ávila é o produtor responsável pela compra dos direitos da série e, em conjunto com a roteirista Jaqueline Vargas e o diretor mais amado do país, Selton Mello, deram a luz à esse brilhante trabalho, competente e de extrema responsabilidade, nos presenteando com esse material tão generoso.

E uma bela curiosidade sobre essa produção é que Jaqueline adaptou as duas primeiras temporadas de acordo com a versão original, mas deu início a uma formação em psicanálise para ter uma base sólida e criar do zero as duas temporadas seguintes que são 100% nossas e ficaram impressionantemente impactantes. Muito amor e dedicação envolvidos!

Uma produção feita com muito cuidado, com um roteiro lindo que, cena após cena, vai nos presenteando com diálogos profundos e personagens tão honestos que sentem e choram como a gente. Uma série onde tudo tem seu encaixe perfeito e uma enorme preocupação com seu impacto social. Uma direção de arte que cuida de cada detalhe com muito afinco, uma iluminação inspiradora e uma fotografia digna dessa equipe tão talentosa. Numa série como essa podemos ver o quão incríveis são seus atores que conseguem expressar tanto e de forma tão visceral apenas com diálogos e olhares. Um sentado de frente para o outro falando sobre a vida e nós, do outro lado, completamente emocionados e entregues a vida que se desenrola diante dos nossos olhos. 


Entrando nas tramas e contextos, podemos começar pelas três primeiras temporadas, onde nos apaixonamos por Théo, vivido por Zé Carlos Machado, um homem de meia idade, casado, com 3 filhos e um terapeuta extremamente empático e entregue a sua profissão. Um homem que enfrenta seus dilemas familiares e pessoais mas, dia após dia, luta para exercer sua profissão com excelência e dar o melhor de si aos seus pacientes, mesmo que muitas vezes esses mesmos pacientes sejam difíceis a ponto de colocar em xeque seu amor pela profissão e sua própria competência.

Théo viveu na infância a dor de ver seu pai indo embora e sua mãe sofrendo de uma severa depressão que a levou ao suicídio. Carrega consigo marcas viscerais e grandes ressentimentos que hoje vê refletido em todos os pontos da sua vida e, na batalha do dia a dia, lida com a lembrança de seu passado nas suas relações e nas interações terapeuta/paciente, que é onde está seu maior desafio. Um homem como todos os outros, enfrentando suas dores para ser um pouco mais feliz.


Na quarta temporada, Zé Carlos não pôde permanecer no elenco por questões contratuais com uma emissora de TV e, depois de lamentos e tristezas, Selton Mello escolhe assumir o posto do terapeuta, arrebatando nossos corações de uma vez por todas com Caio, um homem jovem, casado e com uma filha adolescente, e que é acometido por um terrível drama e faz do seu trabalho sua vida, sua fuga e sua forma de lidar com sua dura realidade.


Quando você entende mais sobre o conflito pessoal de Caio, consegue ter uma real percepção do baita terapeuta que ele é e que, apesar de tudo, dentro das sessões, se mantém integro, forte e completamente centrado nas questões de seus pacientes, completamente entregue a eles. É realmente muito tocante ver seu esforço, seu cuidado e empatia com a dor do outro. É muito emocionante vê-lo com um nó na garganta, quase sem conseguir falar de dor, e ainda assim nunca se perder do que realmente importa naquele momento: o outro.

Caio conheceu desde muito cedo a dor esmagadora do abandono materno, o que gerou profundos traumas. Se fechou para o amor em qualquer formato, foi uma criança intratável e se tornou o adulto que é com a ajuda de anos e anos de terapia, escolhendo assim essa profissão para poder ajudar as pessoas que foram endurecidas pela vida como ele foi.

Ambos os terapeutas passam por momentos críticos de suas vidas e ambos tomam consciência de que não poderiam mais seguir sozinhos, procurando assim ajuda especializada. Mesmo nessa busca, é engraçado observar a dificuldade que eles tem em sentar no sofá do paciente, em expor suas vulnerabilidades e entrar em contato com suas dores primais, e  o quanto, em muitos momentos, ainda reagem com a rebeldia de uma criança aos estímulos que os são impostos para chegar ao resultado esperado. Fica claro o conforto gerado em estar no controle da situação, mas a total inabilidade em sentirem-se controlados.


Num contexto geral, ainda existe muito preconceito quando o assunto é terapia. As pessoas vêem o terapeuta como alguém invulnerável e que muitas vezes as intimida ou acreditam que só “gente louca” busca por esse tipo de ajuda. Observar de fora essa relação estabelecida entre os terapeutas e seus pacientes, é muito importante para termos a chance de humaniza-los, deixando claro que eles passam por problemas tão ou mais sérios que os nossos, e essa é uma das maiores funções dessa série: desmistificar todos os preconceitos que fomos criando sobre o assunto e nos abrirmos para algo tão importante e que tanta gente tem a real necessidade, mas não tem consciência disso.


A série trata de traumas infantis, de grandes perdas e dores passadas, de relações familiares, mas também lida com questões cotidianas corriqueiras, e traz à discussão nossa dificuldade em lidar com a vida e a nossa imensa imaturidade ao lidar com nossas aflições.

A cada nova temporada acompanhamos a vida de todas essas pessoas que entram e saem desses consultórios, suas razões para estarem ali, suas resistências e muita dor, mas também acompanhamos cada passinho no caminho do autoconhecimento e do amadurecimento emocional, cada nova descoberta, cada pequena libertação dos pesos que carregam, cada pequeno progresso que os enche de fé em dias melhores.

Cada um traz consigo uma angústia, mas também um imenso aprendizado, e assim também é com seus terapeutas. Não há exceções aqui, porque todos os personagens são um universo que se abre diante dos nossos olhos, cada ator foi claramente escolhido a dedo para cada situação vivida, cada diálogo é uma pérola a ser observada, cada sorriso que surge, cada ficha que cai, cada olhar carinhoso para si mesmo que preenche. Há muita responsabilidade aqui, há muita competência em um trabalho de tamanha relevância. 

Como uma pessoa em tratamento de depressão, posso afirmar que essa série tem o poder de ajudar muita gente, porque ela trata com muito respeito cada pequena dor. Me senti acolhida e confortada em muitos momentos, tive a clareza de que minhas dores não são só minhas e que dividir experiências pode salvar alguém de vales dolorosos da alma. Acompanhar a evolução de cada personagem é como uma luz no fim do túnel e mostrar que existe um caminho a seguir pode ser a redenção para o coração. Sessão de Terapia me trouxe um otimismo “pé no chão”, sabe? Aquele que sabe que haverão dias difíceis, mas que a memória dos dias bons estarão sempre em mim e me farão reencontrar esse espaço interno novamente cedo ou tarde.

Se eu pudesse dar um conselho, diria: se abra para essa experiência e se permita ser tocado por esse conteúdo tão incrível e amoroso. Abra a sua cabeça para esse momento que estamos vivendo e a importância de se conhecer intimamente para ter qualidade de vida e mais discernimento sobre a realidade que nem sempre é bonita. Todo mundo devia ter a oportunidade de fazer terapia e essa é, cada dia mais, uma realidade para mim.



Título Original: Sessão de Terapia


Direção: Selton Mello


Episódios: 150


Duração: Aproximadamente 25 minutos por episódio.

Elenco: Zé Carlos Machado, Selma Egrei, Maria Fernanda Candido, Sérgio Guizé, Bianca Müller, André Frateschi, Mariana Lima, Cláudio Cavalcanti, Maria Luisa Mendonça, Derick Lecouflé, Rafael Lozano, Bianca Comparato, Adriana Lessa, Ravel Andrade, Selton Mello, Morena Baccarin, Letícia Sabatella, Camila Pitanga, Celso Frateschi, David Junior, Livia Silva, Cecília Homem de Mello, Paula Possani



Sinopse: Sessão de Terapia é uma obra sensível e de uma enorme importância social. Aborda questões profundas e dolorosas com muito respeito e responsabilidade, além de trazer mais leveza e um pouco de esperança para quem está enfrentando aqueles duros encontros com a escuridão interna e por muitas vezes não vê saída.
Um terapeuta cuidando de seus pacientes enquanto lida com a própria vida e com seus próprios demônios. Pacientes que, por muitas vezes, conseguem entender que não conseguem sair do lugar sozinhos, buscando ajuda especializada e afetuosa para seguir em frente. Pessoas encontrando umas nas outras compreensão, clareza e força para terem uma vida melhor. É a beleza da humanidade e do florescer de cada um no seu próprio tempo.

Trailer:

Desfrute dessa obra tão sensível e divida conosco suas percepções!

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