Crítica: O Farol (2019, de Robert Eggers)


Quais os limites do homem? Qual a verdade da natureza? Quais as consequências do completo isolamento? Qual a origem da loucura? Onde encontramos o homem primata? Na taberna do Diabo!



É com essa premissa que nos deparamos ao assistir ao segundo filme do diretor Robert Eggers, O Farol. Este é uma continuação da carreira do cineasta que entrou para o mundo do cinema com seu longa A Bruxa, de 2016.




O filme ainda não chegou aos cinemas nacionais, mas já foi exibido na 43º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e chegou
ao Brasil com alta aceitação do público, principalmente por contar com o
histórico curto, porém incrível de A Bruxa, que na época de seu lançamento foi
ganhador de vários prêmios de melhor filme de terror.


Além disso, O Farol conta também com a presença dos renomados
atores Robert Pattinson e Willem Dafoe, e já é Vencedor do Prêmio da Crítica da Quinzena dos Realizadores no Festival
de Cannes, sendo considerado um dos melhores filmes do ano pela crítica.

O Farol conta a história de um velho faroleiro (Willem
Dafoe) que contrata um jovem (Robert Pattinson), para ajudá-lo em suas tarefas
diárias, porém, o velho o proíbe de ir ao farol, o que só gera maior
curiosidade no jovem perturbado. O filme ilustra ainda a convivência destes
dois desconhecidos no ambiente isolado e pequeno do farol.







O longa, produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira, e pela
mesma produtora de A Bruxa, Produtora A24, traz características sociais
de Eggers em seus filmes, por exemplo, enquanto em A Bruxa, nos deparamos com
um debate mais feminista do cenário do século XVII, em O Farol, nota-se evidenciada a
masculinidade tóxica, ao colocar dois homens do final do século XIX que mal se
conhecem, em um ambiente selvagem.


Por outro lado, uma diferença marcante entre eles, e motivo
de desapontamento de alguns espectadores, foi o fato de enquanto A Bruxa é
considerado um filme de terror extremamente assustador, podendo ser colocado no
mesmo patamar de filmes como O Babadook e Hereditário, em O Farol, Robert
Eggers buscou trazer para a trama um aspecto muito mais cômico e dramático, com
mais características de um terror psicológico, do que com um aspecto
assustador.


Assim, Eggers realiza uma fascinante fantasia de
terror, focada em contos marítimos. Para isso, o diretor fez questão de trazer
para a atuação e diálogo dos atores aspectos clássicos da linguagem marítima da
época, fato que os dois protagonistas realizam com maestria.


A atuação de Robert Pattinson como Ephraim Winslow fez jus a reputação do ator que é conhecido principalmente por longas como Lembranças, Água para Elefantes e que desde sua atuação na Saga Crepúsculo, buscava gêneros distintos para trabalhar.

O ator que já foi confirmado como o próximo Batman de 2021, afirmou que passou por grande preparação para o papel do jovem bêbado e perturbado de O Farol. “Quando se está interpretando uma pessoa louca, você pode ficar bravo o tempo todo. Bem, não o tempo todo, mas por uma hora antes da cena. É possível ficar literalmente sentado no chão, rosnando e lambendo poças de lama”.

Junto dele, interpretando Thomas Wake, o longa contou com a presença de Willem Dafoe, ator conhecido por seus papéis em No Portal da Eternidade, Aquaman e Homem-Aranha, em uma entrevista ele contou como foi para ele trabalhar no longa: “O Farol têm uma linguagem de época, com falas maravilhosas que normalmente não encontramos em um filme, então esse foi um dos prazeres. Robert Eggers é um grande cineasta, esse é apenas seu segundo filme, mas para mim ele é um grande talento”.

Um diferencial da atuação dos dois também, em conjunto com a linguagem de fotografia imposta por Eggers, é o posicionamento dos personagens frente a câmera, a pausa destes olhando para o espectador, as falas profundas que acreditamos que estão sendo ditas um para o outro, mas no fundo são para quem vê o filme, transforma o espectador em um perfeito cúmplice de tudo que se passa no ambiente de O Farol.




Para construir esta atmosfera, Robert Eggers, junto de Jarin Blaschke (Diretor de Fotografia do longa) fizeram uso da estética do preto e branco, utilizando de filmes em película chamados de Double-X acrescentados a um filtro orto-cromático, criado pelo próprio Jarin Blaschke, buscando uma maior granulação na imagem e um aspecto mais retrô, que foi ainda mais evidenciado com o uso de lentes de 1912 e 1930.

O filme também foi gravado em uma dimensão menor do que estamos acostumados atualmente, mais quadrada, buscando uma sensação de claustrofobia, ao ver os dois personagens dividindo durante todo o filme lugares minúsculos, mesmo ainda sendo estranhos um ao outro.


O aspecto em preto e branco em alguns momentos do longa puderam enganar ao público e aumentar a trama de suspense, a ausência de cor fez jus a caracterização de um filme de época e ainda dramatiza cenas com a presença da cor que poderiam se tornar extremamente previsíveis.

O filme no geral foi filmado sobre a perspectiva do jovem Ephraim Winslow, que se vê em um ambiente totalmente diferente de tudo que já viveu, com um homem que nunca viu antes. Esta perspectiva foi muito importante, pois conseguimos ver o avanço do personagem, tanto quanto a interferência do ambiente, da companhia de Thomas ao longo da trama, os estágios de sua loucura, a influência sobre ele a partir do que é dito, como é dito e do que é feito.

Pode-se dizer que a evolução dos personagens ao longo do filme é muito drástica e bem definida, a mudança de atitude, de visão e da relação entre os dois, que parece estar sempre em uma balança, hora pendendo para uma verdade, ora para outra, de forma que em determinado momento já não é possível dizer com certeza absoluta o que é verdade e o que não, quem mente e quem diz a verdade, quem é o verdadeiro louco. E de acordo com o diretor, era exatamente esse o intuito do longa e ele conseguiu realizar de uma forma maravilhosa.




Um aspecto muito marcante no filme, também é o do som, que em todo momento colabora para a criação da atmosfera de terror psicológico e tensão. De forma que a espera do navio para busca-los na ilha é ainda mais intensificada pelo constante barulho que parece o soar de um navio se aproximando. O terror psicológico criado aí é tamanho que é surpreendente quando a partir da atuação, percebemos que o som também está presente para os personagens e de forma muito marcante, a loucura transcende a tela, e intensifica a dúvida do real e do imaginário.

Quanto a esta loucura presente ao longo de todo o filme, foi trabalhada de forma que fosse apresentada principalmente pelos seres místicos, como sereias e polvos gigantes que foram realizados com efeitos especiais e de maquiagem fenomenais, porém, para mim, são os únicos elementos que não tive dúvidas que eram fruto da imaginação dos personagens. Este é um filme muito mais mental do que com aspectos físicos que causem o terror.

Acredito que para a maioria, o elemento mais marcante no longa é a evolução dos personagens no ambiente hostil, o que os próprios protagonistas se referem como o “mundo de mentiras”, a ” caverna do diabo”, o “homem primata”, levados de volta as crenças místicas, religiosas e marítimas, para nos depararmos no fim com a salvação no caminho da luz que os transforma no erotismo carnal feminino, consumido pela alma das criaturas mais próximas da salvação.

Ficou com dúvidas desse final surpreendente? O longa chega aos cinemas no início de 2020, não deixe de conferir e contar pra gente o que achou, afinal… “Porque contar seus segredos?”





Título Original: The Lighthouse


Direção: Robert Eggers

Duração: 109 minutos

Elenco: Willem Dafoe, Robert Pattinson, Valeriia KaramanSinopse: No início do século 20, Thomas Wake trabalha como guardião de um farol. Ele contrata o jovem Ephraim como seu ajudante, mas o rapaz fica curioso em relação a segredos e a lugares privados no local, o que provoca estranhos fenômenos ao redor dos dois.



Trailer:

Gostou da crítica, conte pra gente o que achou nos comentários 🙂

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