Crítica: Segredos Oficiais (2019, de Gavin Hood)

Antes de mais nada se faz necessário expor que esta não é uma crítica comum, visto que não se trata de um filme comum. O que você faria se descobrisse, em um e-mail de trabalho, que entrarão em curso ações de investigação contra membros da ONU, de modo a determinar sua posição frente à uma possível guerra e garantir que estas sejam favoráveis aos interesses do governo dos Estados Unidos? É com essa premissa que se tem início o longa de Gavin Hood, Segredos Oficiais

Inspirado em fatos reais, o filme tem início em 2003, no dia em que a tradutora britânica Katharine Gun,  que há dois anos trabalhava na GCHQ, uma agência de inteligência britânica  fica a par de uma manobra estadunidense para conseguir votos favoráveis de membros não permanentes da ONU à guerra contra o Iraque. Instruída a não questionar as ordens e decisões do governo britânico, Katherine decide entregar uma cópia da mensagem a membros da mídia, para investigarem a fundo as implicações deste documento.

A tradutora, que mesmo antes já questionava a manipulação de informação por parte da mídia e as reais motivações do então presidente estadunidense, George W. Bush, — que chegou a acusar Saddam de ser o responsável pela tentativa de assassinato de seu pai na década de 90 — tem sua vida virada do avesso ao ver o documento ultrassecreto divulgado na íntegra por Martin Bright, do jornal The Observer.


É fato que Segredos Oficiais apresenta um belíssimo filme, com uma direção de fotografia fenomenal e atuações incríveis de um elenco de peso, — intercaladas com imagens de arquivo da época em que se passa o filme — mas sua relevância e atualidade reside no debate que ele propõe; principalmente no contexto político atual, em que a mídia claramente desempenha um papel mais do que parcial e, muitas vezes, enganoso. 


Ao considerarmos o caso da Cambridge Analytica influenciando as eleições estadunidenses a favor de Donald Trump e na Inglaterra a favor do Brexit, não é tão difícil perceber a dicotomia simplista propagada pela mídia entre bem x mal. E no Brasil não foi diferente, com as fake news também decidindo os resultados da votação para presidente, em 2018. Como o próprio filme coloca, “na melhor das hipóteses as informações são imprecisas”. E o custo disso é alto.



Ameaças veladas, medo consumindo a cada segundo e, ainda sim, uma mulher que prova que uma pessoa pode sim começar a mudar o seu mundo. É, obviamente, fundamental para a questão da representatividade, termos filmes de superheroínas, mas é igualmente importante saber reconhecer as mulheres da vida real que colocaram tudo a perder em nome de um propósito. E a frase que mais chama atenção de Katharine Gun é de que “os governos mudam, eu trabalho para o povo britânico”. 


Essa é a história de uma mulher memorável, que escolhe lealdade ao país ao invés de ao governo, marido e ela mesma; o que diz muito sobre ela e sobre do que se trata o filme. Afinal, cultura também é política e, não por acaso o governo brasileiro vem lutando tão arduamente para acabar com a nossa. É com a cultura, não com armas, que as guerras são de fato travadas. Ou os filmes de James Bond escolhiam os perfis dos inimigos em um sorteio?


O longa é, portanto, uma aula de direito, cidadania e cultura; uma espécie de chamado para cada um pensar no seu papel enquanto sociedade e como uma pessoa só pode sim fazer a diferença. Principalmente em um país como o Brasil em que a mentalidade é de “se ninguém faz nada, por que eu?”, o questionamento levantado é outro “se eu não fizer, quem vai?”. 




A escolha da atriz, por fim, não poderia ser melhor. Para quem lembra de Keira Knightley em O Jogo da Imitação, é impossível não traçar o paralelo entre Joan Clarke e Gun; uma utilizando a inteligência para encurtar a guerra e a outra para evitá-la. Esse filme relembra, a todos que se graduaram em cinema, o porquê ter escolhido a área e amá-la tanto. É um questionamento de uma guerra que, somente em seus primeiros anos, matou de 151 mil a um milhão de iraquianos, incluindo civis, crianças, mulheres e idosos. Isso sem contar os feridos e soldados americanos e britânicos.

Título Original: Official Secrets


Direção: Gavin Hood


Duração: 112 minutos


Elenco: Keira Knightley, Matt Smith, Adam Bakri, Matthew Goode, Ralph Fiennes, Rhys Ifans, Indira Varma e Myanna Buring.


Sinopse: Depois de passar anos trabalhando como tradutora de mandarim para inglês, Katharine Gun (Keira Knightley) tornou-se mundialmente famosa ao expôr segredos extremamente confidenciais da Agência de Segurança Nacional. Depois de obter acesso a memorandos secretos, ela foi capaz de provar que ocorreu uma grande pressão a seis países para que eles votassem a favor da invasão ao Iraque em 2003.


Trailer:

E você, o que achou do filme? Deixa aqui embaixo seus comentários! E… girl power!👸😉


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