Embustes na Indústria do Cinema – PARTE 1 #ManDown

     Não é novidade que quando as pessoas se tornam famosas a tendência é serem endeusadas, idealizadas… Enfim, colocadas num pedestal. Claro que talentos merecem ser reconhecidos, mas mais que isso é preciso sabermos que por trás dos mesmos existem apenas pessoas. Seres humanos que não estão imunes a erros. Inclusive muitas vezes ficamos decepcionados por descobrirmos coisas ruins que nossos ídolos tenham feito. Tem coisas que são extremamente graves e que talvez nem com o pedido de “desculpas” mais sincero consigam refazer a imagem que antes tínhamos dessas personalidades, porém, se tal pedido ao menos tivesse existido a situação seria menos pior. Seria o mínimo que eles poderiam fazer. 


     A ideia aqui é não “passar pano” para ninguém, independente de seus filmes, status e qualquer coisa, por mais que eu ou você, leitxr, possa ser fã. É um exercício que eu convido você a fazer, porque dessa forma estaremos exercitando nosso senso crítico, ou simplesmente o bom senso. Lembrando que claro que as pessoas podem mudar, e eu torço por isso, embora eu possa já ter pego um certo “ranço” incorrigível diante desses cineastas e atores que serão citados. 

     Busquei priorizar aqui ações equivocadas referente à machismo, abusos sexuais ou de autoridade e assédio moral. Porque o mais “cômico” de tudo isso é que quando alguma atriz comete algum deslize, ela é extremamente julgada e sua estrela se apaga muito. Cito aqui o caso de Winona Ryder que por ter tido um acesso cleptomaníaco e ter roubado uma loja, foi altamente julgada – lembrando que cleptomania é uma espécie de doença. Não foi algo feito por maldade. – E depois disso ela ficou um bom tempo longe dos holofotes… Dificilmente alguém a chamaria para trabalhar também. Mas qualquer um dos homens dessa lista não ficaram sem acolhimento, muito menos tiveram suas carreiras interrompidas. E tais fatos que vou citar caíram no esquecimento, não são mais comentados. Pior! São ignorados. E posso provar que qualquer erro da lista abaixo é mais grave do que o de Winona.

     Agora vamos à lista. Chega mais quem quer ver man down

Tarantino

     Pouca gente lembra da “treta” entre ele e Uma Thurman, então vamos refrescar a memória. O fato é que todos sabiam da amizade entre os dois e o quanto ela era sua “musa”, porém, durante a gravação da famosa cena de Kill Bill, em que Thurman dirige um carro para matar Bill, a atriz ficou com medo de dirigir o veículo, que não estava funcionando muito bem. Thurman disse ter insistido no fato de que não se sentia confortável operando o carro e que preferiria que um dublê o fizesse. Os produtores dizem não se lembrar de nenhuma objeção. (Sim, isso me parece um complô). 



     Em seu relato, Uma disse: “Quentin veio ao meu trailer e não gostou de ouvir ‘não’, como todo diretor. Ele estava furioso porque eu tinha custado muito tempo para eles. Mas eu estava com medo. Ele disse: ‘Te prometo que o carro está funcionando. E é uma estrada reta.’”


   Tarantino, então, a convenceu a fazer a cena e a instruiu: “‘Chegue a 64 km/h, senão seu cabelo não vai voar do jeito certo e farei você repetir.’ Mas eu estava dentro de uma máquina da morte. O banco não estava fixado do jeito certo. A estrada não era pavimentada e não era reta.”


  Conclusão: a atriz sofreu um terrível acidente e tem sequelas até hoje e apenas 15 anos após essa briga enorme é que Tarantino deixou Uma ver as imagens do acidente. Como se isso já não fosse grave, Uma foi abusada sexualmente pelo produtor Harvey Weinstein, que era amigo de Tarantino.

 
   Weinstein distribuiu todos os filmes de Tarantino, incluindo Pulp Fiction (1994). Quando o escândalo foi a público, o diretor disse que “sabia o suficiente para fazer mais do que fez”. Então a pergunta é… Por que não fez??? Um profissional desses só consegue cair no meu conceito e também em meus princípios referentes ao respeito, independentemente da qualidade de tudo que ele já tenha feito e criado. Acho que já está mais do que na hora de acabar com essa história de pedestal, seja para quem for. 



    Além disso, se ao longo de sua filmografia Tarantino nunca antes havia se deixado levar por escolhas de planos machistas e sexistas, então porque agora em seu filme mais recente: Era uma vez… em Hollywood? Já é de se esperar isso de filmes como Velozes e Furiosos, mas não imaginava essa decepção vinda de Tarantino ainda mais em 2019. Meio tarde demais para cometer essa gafe, né? Acorda, o feminismo está aqui! 

  O que são planos machistas e sexistas? Planos que privilegiam as “curvas” da mulher tratando-a como um mero pedaço de carne, um divertimento, um objeto. Tudo indica que Tarantino está provando que é possível regredir. Parabéns. 

Cena da personagem de uma garota hippie flertando com Brad Pitt em Era uma vez em… Hollywood. Nesta mesma cena tem um plano em que a câmera está posicionada mais atrás da garota, angulada estrategicamente para que suas nádegas ocupem quase metade da tela de maneira imensa e altamente objetificada. Infelizmente não consegui encontrar este plano na internet para expor aqui. Mas é exatamente nesta cena. 

    Abaixo Velozes e Furiosos e alguns dos seus MUITOS planos sexistas. A franquia já está em seu NONO filme e podemos ver este mesmo plano em todos eles. Parabéns aos envolvidos. 
 
HitchCOCK

 

 
  O queridinho do suspense não vai ficar de fora não. Apesar de ter revolucionado muitos aspectos do cinema, isso não significa que é um Deus na terra e que pode tratar sua equipe e atores como bem entender. Provável que o erro na educação desse homem (e de muitos) é nunca ter ouvido um “não”. 


   Hitchcock sempre se refiria aos seus atores como “gado”, querendo dizer que não têm autonomia e nem vontade própria tendo que obedecê-lo. Então além de ofender os atores, o diretor também ofende o gado, essa espécie de animal, que é muito mais que isso. 

   Como se não bastasse, a nossa “estrela” da vez também era conhecido por fazer torturas psicológicas com seus atores, aliás, principalmente com as atrizes. Talvez fosse perseguição às mulheres que recusavam suas “cantadas” nos bastidores? Não duvido… Um homem frustrado é capaz de cada coisa… Só um exemplo: no set do filme Os Pássaros, Tippi Hedren chegou a ser amarrada com pássaros para então entregar uma “atuação mais verdadeira”. Essa história de “os fins justificam os meios” é apenas maquiavélica mesmo, não tem nada a ver com ser um bom rei… ops, um bom diretor, profissional, ou qualquer mentira que ele tenha contado para si mesmo em prol de justificar tamanha doença. Outra coisa que deveria indignar a todos é que quantos desses diretores já fizeram isso na frente das pessoas da equipe e quantas delas tomaram alguma atitude para ajudar as atrizes e atores que eram torturados? Pois é, o silêncio é um tanto quanto perturbador, ou pior, é um cúmplice. 

A “querida” dupla: Bertolucci e Marlon Brando


    Seguindo a mesma linha da desculpa: “Fiz isso porque visava uma atuação real”, o absurdo que vamos ver agora é a respeito do estupro e assédio que ocorreu durante as gravações de: O Último Tango em Paris.  


   O problema já começa na perversão que tem ao colocar como “par romântico” Maria Schneider, que na época só tinha 19 anos, e Marlon Brando, com 48 na época. 

   Para uma cena acontecer, além de estar no roteiro, os atores também seguem o direcionamento do diretor, claro. Mas é possível haver improvisos também. O problema é que Bertolucci apenas conversou sobre isso com Brando para que a reação da atriz fosse a mais verídica possível. Bom, parabéns, conseguiram. A atriz começou a usar drogas depois disso, pois queria fugir da realidade de sua própria memória toda vez que se lembrava dessa cena.


  Maria Schneider já sabia da existência da cena, mas Marlon Brando e Bertolucci sempre gostavam de inovar e improvisar algumas coisas na hora de gravar. Seria realmente uma cena de estupro, mas Brando teve a brilhante ideia de adicionar o detalhe da manteiga, com a qual ele lambuzaria os dedos e, após arrancar violentamente as calças da atriz, introduziria nela. 


   Independente de ter tido penetração, isso não muda o fato da atriz ter se sentido envergonhada e usada pelos colegas de trabalho. Marlon Brando reconheceu que após ter gravado a cena sequer perguntou se a atriz estava bem e como se sentiu. 


   Não houve consentimento da atriz para a cena acontecer da maneira que aconteceu, e ela sequer sabia que isso iria acontecer. Na época muitos diziam que a atriz estava mentindo, que aquilo não aconteceu. Dentre eles Vittorio Storaro. O famoso diretor de fotografia, disse que estava presente no set e que não houve constrangimento; que Maria Schneider sabia de tudo da cena. É aquela velha história: “Meu amigo não fez nada, a mulher é que é louca e mentirosa”. 

Foto que traduz o sentimento: “Sai embuste! ‘Não’ é ‘não!’”
     Essa história voltou à tona em 2013, por conta de uma entrevista que Bertolucci deu falando que realmente não havia tido consentimento da parte da atriz. Quer dizer, depois de muito tempo que o filme foi feito a verdade pode vir a tona, e agora talvez Storaro possa parar de mentir junto com todos seus outros amigos e capangas. E o mais incrível de tudo isso é que quando a atriz falava sobre, as pessoas não lhe davam credibilidade, mesmo ela sendo a vítima; agora todos acreditam porque foi um homem que disse. 


   A cena não só marcou a atriz de forma traumática, mas também a transformou num sex symbol. Infelizmente após esse filme as propostas de trabalho que chegavam para ela eram de filmes eróticos. Quando o mercado nos faz acreditar que é sexy uma cena de estupro é porque realmente chegamos ao fundo do poço. 

   Ainda tiveram a pachorra de nomear Bertolucci e Marlon Brando no Oscar em 1974, e em 1973 apenas Marlon Brando por sua atuação em O Poderoso Chefão. Quer dizer… Olha só as propostas de trabalho que o cara recebe após o que fez e olha a vida da vítima? A atriz voltou a ter amizade com Marlon Brando – o que eu jamais faria, mas são escolhas, né – enquanto Bertolucci em si, jamais lhe pediu desculpas. Aliás, olha só como a vida dela terminou: morreu de câncer em 2011 e nunca lhe fizeram justiça. “Nojo” seria uma boa palavra para definir o sentimento por toda essa história. 

Quando forem à Los Angeles, façam o favor de pisotear com vontade a estrela de Bertolucci na calçada da fama. 

   É uma pena essa matéria existir, pois isto significa que tais coisas de fato aconteceram. Relatar eventos assim não deve deixar ninguém feliz, mas já que tais coisas acontecem, é preciso que estejamos sempre lembrando delas, porque parece muito fácil “deixar pra lá” o machismo. A questão é que não estamos o diminuindo quando pensamos assim; ele permanece ao nosso lado, no nosso dia a dia, principalmente na realidade das mulheres e no medo que elas sentem na sua rotina, e até em seu ambiente de trabalho, no caso o cinema, um set, uma première. Chegamos a um ponto em que “deixar pra lá” não é uma opção. Venha se desconstruir junto conosco! Conhecer esses tristes casos e cobrar a sociedade, a indústria cinematográfica para prestar contas sobre isso. Não deixe que estes infelizes casos – já que aconteceram – caiam no esquecimento. 


   Esta é a primeira matéria que falo sobre isso, mas nem de longe é a última. Na próxima lista continuaremos a nossa saga man down com: Woody Allen (ou Alien também serve), Kubrick e Lars Von Trier. E receio, infelizmente, que ainda tenhamos muito mais. 


   Convido todos, independente do gênero, para conhecer essas histórias e denúncias mais afundo. Antes tínhamos que aprender a dizer “não” a esses abusos sexuais e morais, agora, mais do que nunca, temos que aprender a dizer: “nunca mais!”. 


Caro leitor, deixe aqui seu comentário após 1 minuto de silêncio em respeito e apoio às vítimas. 

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