Crítica: Sócrates (2018, de Alexandre Moratto)

   


“Mora com teus pais, né? Não. Com quem que tu mora? Com ninguém”. Esse sentimento de solidão e falta de lugar acompanha o protagonista Sócrates (Christian Malheiros) no decorrer dos 71 minutos que compõem o filme homônimo. Sócrates tem início com a morte da mãe do personagem, um garoto de 15 anos, que não tem tempo de sofrer por sua perda, pois está a todo momento procurando meios de garantir a própria sobrevivência, já que a única pessoa que o aceitava e protegia faleceu. 

No decorrer do filme, acompanhamos de perto – uma vez que a câmera é posicionada atrás e muito próxima ao personagem, as tentativas empreendidas pelo adolescente na busca pelo mínimo: alimento e abrigo. A despeito de todo o sofrimento que o luto e a necessidade lhe infligem, ele se mantém forte. E, nesse sentido, é importante ressaltar a atuação impecável e comovente de Christian Malheiros que, sobretudo, por meio de seus silêncios e linguagem corporal, consegue expressar esse misto de emoções que povoam os pensamentos de Sócrates.

Entre a fuga e a expulsão dos lugares por onde passa, o protagonista é vítima de vários preconceitos, principalmente, por ser negro e homossexual. Ao conhecer Maicon (Tales Ordakji), eles iniciam um relacionamento amoroso, que coloca em cena o sorriso raro de Sócrates e parece ser um respiro necessário do personagem diante de suas agruras, mas essa aproximação resultará em outra perda para ele.

O longa, dirigido por Alexandre Moratto, foi produzido pelos alunos do Instituto Querô na Baixada Santista e foi premiado nacional e internacionalmente. A trama desenvolve-se, também, na Baixada Santista e tem uma bela fotografia, na medida em que alterna a vista da cidade – com seus sons característicos, transportes e grande contingente de pessoas, que parecem engolir o personagem, com as visões da praia e do porto.

Estes espaços litorâneos estão associados aos momentos de reflexão e pequena suspensão das dificuldades enfrentadas por Sócrates, como na cena em que ele passeia com Maicon na praia. A trilha sonora é brasileira e composta por músicas de funk e rap, o que é interessante porque representa parte da cultura e das manifestações artísticas brasileiras e periféricas.  
Ao final, é possível observar que, como afirma Chevalier, em seu Dicionário de Símbolos, a água simboliza regeneração e o mar, nesse sentido, representa a transformação do protagonista ao aceitar despedir-se de sua mãe e deixá-la ir. Dessa forma, é ao mar que o personagem confia seu bem mais precioso e sente-se acolhido, fazendo dele o seu refugio e abrigo. O filme é incômodo, tocante, necessário e o fato de ter sido produzido pelo Instituto Querô só o engrandece, pois se trata de instituto sem fins lucrativos e voltado para ações de caráter social, educacional e cultural para os moradores do espaço onde o filme foi produzido




Título Original: Sócrates

Direção: Alexandre Moratto

Duração: 71 minutos

Elenco: Christian Malheiros, Tales Ordakji, Caio Martinez Pacheco, Jayme Rodrigues e Rosane Paulo

Sinopse: Depois da morte da mãe que o criou, o jovem Sócrates precisa tentar sobreviver sozinho em São Paulo. A dura realidade coloca seus valores e ideais à prova, e ele precisa enfrentar o luto, a miséria e o preconceito em relação à sua sexualidade.

Trailer:

Sócrates estreia dia 26 de setembro nos cinemas. Assistam e depois nos contem o que acharam. 🙂



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