Crítica: Somos Tão Jovens (2013, Nacional)







“Uma menina me ensinou

Quase tudo que eu sei

Era quase escravidão
Mas ela me tratava como um rei”





Demorou mas não tardou. Finalmente minha crítica de um dos filmes nacionais mais comentados do ano. A esta altura acredito que a maioria já está ciente do que se trata: o filme explora o início da carreira do lendário Renato Russo, vocalista e principal compositor da banda de rock ‘Legião Urbana’. Durou de 1982 até 1996, quando Renato faleceu vítima de AIDS. Mesmo hoje, depois de um bom tempo; continua sendo uma das bandas mais lucrativas da história do nosso país. De lá para cá praticamente todas gerações tem tido seus fãs de Legião. Sempre fui preconceituoso com o que é nosso: tanto no cinema como na música. Mas com o passar do tempo e as experiências que se ganha, fui adquirindo certo respeito por algumas produções chave do nosso país. Acho que foi por 2007 que comecei a gostar de algumas bandas nacionais, incluindo ‘Legião Urbana’, mas foi somente em 2011 que passei a reverenciar o trabalho de Renato Russo. Os motivos? Em 2011 me apaixonei pelo filme brasileiro ‘O Homem do Futuro’; um filme um pouco bobo é verdade. Mas devido à época que me encontrava, aos sentimentos envolvidos e à trilha sonora composta da música ‘Tempo Perdido’ do Legião; foram fatores decisivos para mim acabar me apaixonando por alguns trabalhos de Renato Russo. Agora que revelei que a letra da música ‘Tempo Perdido’ tem um imenso significado para mim, o que posso dizer do filme em questão,’Somos Tão jovens’?







Falar dele pode ser delicado, pois há os fãs da banda, há os fatores críticos e cinematográficos, há minhas preferências pessoais; enfim há muita coisa envolvida. Mas no geral o filme é bom, só não é tudo que podia ser. Vou falar dos pontos negativos primeiro. De cara já digo que é uma produção “brasuca”, com aquelas limitações características do nosso cinema. A direção e alguns ângulos de câmera não são inspirados e em certos momentos perdidos. O palavreado, as atuações de grande parte do elenco e uma ou outra cena ainda transparecem um teor amador. O roteiro é bem básico, do tipo que você já viu em outras cinebiografias. E outro fator que pode gerar decepção é o filme ser curto. Com cerca de 1 hora e 40 minutos, fica faltando no mínimo mais 1 hora de filme. A vida de Renato Russo é tão cheia de questões, de polêmicas e mensagens que 3 horas seriam poucas! Então o filme acaba não sendo das melhores cinebiografias. Na verdade ele se concentra em apenas um pedaço da vida do músico, o início da carreira. Todas as questões sobre a morte dele ficaram de fora. Nisso fica a sensação de pesar, já que o filme poderia sim ter levado às lágrimas no final se tomasse este rumo já citado.


Quer dizer que o filme é ruim? Lógico que não. O ruim é que ele acaba cedo demais. Acho que para quem se interessa pelo rock nacional que estourou em Brasília na época da ditadura e para principalmente os fãs de Legião Urbana; fica aquele gosto de “quero mais”. Mas aí começam os acertos. Por outro lado, o filme é juvenil e nada maçante. O fôlego jovem de Renato Russo é perfeitamente transparente na pele de Thiago Mendonça; que está brilhantemente parecido com o cantor em questão. De longe ele tem a grande atuação do filme, mostrando os lados de Renato Russo. Não o cantor idolatrado, mas o jovem confuso, boêmio e muitas vezes impulsivo. Um mero mortal como você ou como eu. E este tipo de evidência em um filme sobre alguém famoso é interessantíssimo. No fundo todos temos nossos problemas e nossos talentos. A questão é que alguns conseguem mostrar estes talentos de maneira inimaginável. E é isto que  o filme retrata. Mas todo sucesso requer esforço, sacrifícios, perdas, tentativas e um pouco de excentricidade. E sobre ser excêntrico eu entendo! Todo este lado “humano”, este lado imperfeito de uma pessoa é algo sempre bem vindo para reflexões. E nisto o filme acerta em cheio.




Ponto forte do filme também é mostrar brevemente o início de outros artistas e bandas importantes, como Capital Inicial, Os Paralamas do Sucesso, etc. Todos estes começaram numa época conturbada, onde o regime militar afogava e acabava com todo feixe de luz e originalidade. Ousando e desafiando, artistas de todos os meios faziam sua parte contra a tirania. Amo esta parte da nossa história, onde músicos, como o próprio Renato, lutavam contra a violência através de suas palavras e expressões. Fica a lição de que as melhores coisas surgem através das tempestades da vida e da sociedade. O clima leve do filme em nada atrapalha ou ofusca seu lado social, onde percebe-se em certos momentos que o povo vivia em uma sombra obscura. Neste quesito, parabéns aos roteiristas.


Também devo salientar que o filme mostra de maneira brilhante como algumas das melhores músicas da banda surgiram. Algumas foram ao acaso, “meio que do nada” por assim dizer. Outras foram através de brigas, decepções ou trapaças (Renato gravava sem permissão algumas conversas, para depois em sua casa escutar e se inspirar). O filme começa bem com a música ‘Tempo Perdido’, que como já foi dito é minha favorita, e ela é a razão do título do filme. Mas há outra música que em certo momento fica em evidência: ‘Ainda é Cedo’. É dela estas palavras que iniciei minha crítica. No clímax do filme, lá pelo final; Renato Russo dedica esta canção à sua melhor amiga (e sua grande paixão hétero apesar dele ser homossexual?). Muito bem atuada por Laila Zaid, a personagem de Ana Cláudia (personagem fictícia baseada em diversos romances do cantor) seria grande parte do esforço e inspiração do artista central. Isso me remete a um fato muito discutido: por trás de todo grande homem (o que o torna grande seriam suas habilidades e feitos) há uma grande mulher (grande no sentido de causar de algum modo, seja positivo ou negativo, suas ações e obras)? Sim, isto dá o que pensar sobre tudo na vida, aqueles com quem temos contatos e as marcas que deixamos neles.





Entre erros e acertos, o saldo de ‘Somos Tão Jovens’ é positivo, mata um pouco a saudade dos fãs e cumpre seu papel de mostrar como tudo começou. 2013 é o ano de Renato Russo e sua ‘Legião Urbana’ no cinema, já que uma de suas mais audaciosas músicas, ‘Faroeste Caboclo’, ganhou um filme, também de sucesso e movimento. Espero falar sobre ele em breve. Enquanto isso ficamos com esta volta no tempo, onde ser roqueiro era desafiar um governo e toda uma sociedade. Sociedade esta que sempre foi hipócrita, mas que já teve seus momentos mais obscuros através do autoritarismo militar. ‘Somos Tão Jovens’ distrai numa boa e agradará os mais fanáticos por Legião, mesmo que por um breve momento. E para quem tem alguma história particular com a banda ou uma das músicas (meu caso já citado), o filme é sim uma boa programação. 


E torna-se inevitável eu pensar em certas coisas, o quanto o tempo passa rápido, estou ficando velho, algumas poucas coisas boas mudam, algumas boas pessoas se vão; mas o quanto o que é ruim continua aí. Não temos mais a ditadura, mas temos “liberdades” que nos aprisionam cada vez mais. E enquanto o mundo caminha nesta triste direção; de vez em quando encontramos alguém apaixonado pelo o que faz, alguém visionário, alguém com um dom, um poeta. Poeta não de textos, mas poeta da vida. Renato Russo (e alguns bons artistas de gerações diversas) são alguns exemplos. Meros mortais cheios de falhas (motivo de eu não idolatrar ninguém), mas que inegavelmente marcam a vida de alguém através de suas canções e palavras. Inevitavelmente eu loto a mente de pensamentos, alguns refletindo que um cara que um dia foi apenas um adolescente perdido e rebelde; hoje continua marcando gerações com um trabalho bem feito e dedicado. Fica aqui revelada a opinião deste humilde cinéfilo, jovem e sonhador: não há um dia sequer que eu não me esqueça de que meu tempo está passando. Espero que de algum modo esteja deixando minha marca. Afinal, como diz a canção: “nem foi tempo perdido – somos tão jovens!”

NOTA: 8








Tempo Perdido







“Todos os dias quando acordo,
Não tenho mais o tempo que passou



Mas tenho muito tempo



Temos todo o tempo do mundo.




Todos os dias antes de dormir,



Lembro e esqueço como foi o dia



“Sempre em frente,



Não temos tempo a perder”.





Nosso suor sagrado



É bem mais belo que esse sangue amargo



E tão sério



E selvagem,



Selvagem;



Selvagem.





Veja o sol dessa manhã tão cinza



A tempestade que chega é da cor dos teus



Olhos: castanhos.



Então me abraça forte e,



Me diz mais uma vez



Que já estamos distantes de tudo



Temos nosso próprio tempo,



Temos nosso próprio tempo.
Temos nosso próprio tempo.





Não tenho medo do escuro,



Mas deixe as luzes acesas agora,



O que foi escondido é o que se escondeu,



E o que foi prometido,



Ninguém prometeu.





Nem foi tempo perdido;



Somos tão jovens,



Tão jovens,



Tão jovens.”








Direção: Antônio Carlos da Fontoura


Elenco: Thiago Mendonça, André de Carvalho, Antonio Bento, Bianca Comparato, Bruno Torres, Conrado Godoy, Daniel Passi, Edu Moraes, Henrique Pires, Ibsen Perucci, Kael Studart, Kotoe Karasawa, Laila Zaid, Leonardo Villas Braga, Maísa Lacerda, Marcos Breda, Natasha Stransky, Nathalia Lima Verde, Nicolau Villa-Lobos, Olívia Torres, Paulo Wenceslau, Rene Machado, Sandra Corveloni, Sergio Dalcin, Thiago Casado, Victor Carballar, Vitor Bonfá, Waldemiro.


Sinopse: Na trama, o jovem Renato Russo não tem tempo a perder: sonha ser um astro do rock. Mas ainda é cedo. Ele precisa estudar, dar aulas de inglês, tranquilizar os pais, curtir a turma, curar dores de amor e, principalmente, arrumar quem toque na sua banda. Do Aborto Elétrico à Legião Urbana, “Somos Tão Jovens” apresenta os primeiros acordes do mito Renato Russo e da turma do Rock Brasília, criadores de sucessos como “Que País é Este”, “Geração Coca-Cola”, “Eduardo e Mônica” e muitas outras músicas que marcam e transformam fãs geração após geração.


Trailer:




Bônus: algumas das canções mais marcantes da banda. Dê pausa na trilha sonora no player em baixo no blog e escute as canções.


Tempo Perdido
 (minha música nacional favorita)




Mais uma Vez




Geração Coca-cola





Eduardo e Mônica




Pais e Filhos




Hoje a Noite Não tem Luar







Será







Ainda é Cedo








A Cruz e a Espada
(lindo dueto entre Renato Russo e Paulo Ricardo)







Faroeste Caboclo
(esta canção virou filme, mas isto é outra história para outra postagem)





















Deixe seu comentário:

Deixe uma resposta