Crítica: Democracia em Vertigem (2019, Petra Costa)

O Brasil caminha hoje, a passos largos, para um grande colapso político-social. Talvez muitos pensem que o real colapso ocorreu logo quando Jair Bolsonaro foi eleito presidente, outros pensem que não passa de um mero praguejamento contra o atual governo, mas fato é, que cada vez mais, vamos vendo os indícios de uma bomba que está prestes a explodir.

Nossa nação demorou muito tempo para erguer uma forma de governo que pelo menos aparentasse democrática. Após longos anos de ditadura, fruto de um golpe militar ordinário, a democracia de faz de conta, que se mostrava até então sólida e em pleno funcionamento, começou a ruir tal como a ponte de Tacoma Narrows: o que começou com uma pequena amplitude se transformou em abalos gigantescos, culminando na ruína.

Muitos de nós, que ainda conservam alguma sanidade em meio ao caos político-social que estamos vivendo, aliviam sua perplexidade através de memes, piadas e sátiras. Parece ser a nossa morfina para aguentar esses dias dolorosos. Porém, quando nos deparamos com um documentário como Democracia em Vertigem, que trata de um recorte histórico muito verdadeiro e fiel de todo este período supostamente democrático que vivemos no país, fica difícil conter as lágrimas e disfarçar a indignação.

Petra Costa, a idealizadora, produtora e diretora do longa, já era destaque pelo tocante Elena, mas nem sua já conhecida voz doce e calma e seu suave sotaque mineiro conseguem nos alentar, conforme vai narrando os acontecimentos que nos levaram até este momento. Em todo tempo percebemos que ela tenta se distanciar de todo o cenário, porém, hora ou outra acaba imprimindo uma opinião, seja em sua narração, seja através de arquivos de vídeos pessoais, abusando de uma trilha sonora mais comovente e/ou arrebatadora (o que por vezes soa como uma pitada de apelo emocional).


A relação de Petra com a democracia é de certa forma íntima: seus pais foram torturados e presos durante a ditadura militar e é de parte de sua família uma das construtoras mais antigas do Brasil e também envolvida na operação Lava-Jato; assim, não poderíamos ter alguém melhor para falar do assunto, com tamanha propriedade.

Vale lembrar que, o que muitos já sabiam há tempos e agora se confirma através de mensagens vazadas pelo site The Intercept Brasil, também figura no documentário de Petra: a grande jogada do judiciário para orientar o processo político tal como era de interesse e objetivo dos poderosos. O problema, contudo, foi que ao cutucarem a onça com vara curta, não somente despertaram uma onça brava com sentimento de ter sido traída, mas uma racista, homofóbica, machista, xenófoba, amante da violência e sem qualquer senso crítico.


Dessa forma, traçar todo o caminho que levou ao marco de nossa ruína torna-se não somente um trabalho necessário, mas ainda um lembrete da força de um povo. O mesmo povo que colocou Lula no poder, acreditando que suas vidas melhorariam, mesmo que com acesso somente às migalhas (parafraseando um depoimento do próprio documentário), esse mesmo povo se viu traído e tal como a mídia e a oposição afirmavam categoricamente, a prisão parecia algo muito óbvio para o ex-presidente. De lambuja, a sucessora Dilma Rousseff, que teve que aguentar o horror de uma ditadura militar, para depois ter que se submeter à politicagem barata que a tal democracia exigia, teve seu impeachment decretado, atendendo principalmente aos anseios da população manobrada. 


Um escritor grego disse que a democracia só funciona quando os ricos se sentem ameaçados. Caso contrário, a oligarquia toma o poder. […]Somos uma república de famílias. Umas controlam a mídia, outras, os bancos. Elas possuem a areia, o cimento, a pedra e o ferro. E, de vez em quando, acontece delas se cansarem da democracia, do Estado de Direito. Como lidar com a vertigem de ser lançado em um futuro que parece tão sombrio quanto nosso passado mais obscuro? O que fazer quando a máscara da civilidade cai e o que se revela é uma imagem ainda mais assustadora de nós mesmos?

Petra não nos dá a resposta. Talvez, é porque não haja uma mesmo. Contudo, se utilizar de uma plataforma como a Netflix para mostrar ao mundo esse recorte da história brasileira, mesmo com alguma inclinação política, cria uma acessibilidade facilitada ao conteúdo, uma vez que grande parte das pessoas possui o serviço de streaming. Daí, pode-se iluminar certos pensamentos ao terem contato com o material, desde que se tenha certo senso crítico… Só o tempo dirá.

Título Original: Democracia em Vertigem (The Edge of Democracy)


Direção: Petra Costa

Duração: 121 minutos

Elenco: –

Sinopse: Documentário político e memórias pessoais se misturam nesta análise sobre ascensão e queda de Lula e Dilma Rousseff e a polarização da nação.

Trailer:

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