Crítica: Gauguin – Viagem ao Taiti (2017, de Edouard Deluc)

O ano é 1891, e cansado do marasmo da sociedade francesa, Paul Gauguin, até o momento um artista desconhecido por suas obras, abandona sua vida parisiense e parte para os confins do Taiti em busca de novos ares que possam trazer-lhe inspiração. Na tentativa de expressar a selvageria e o naturalismo em suas telas, o que antes não era visível na metrópole, acaba encontrando Tehura, índia absorta pela curiosidade no homem branco recém chegado, que vem a tornar-se sua esposa e acima de tudo, sua maior inspiração.








Neste filme, o abrasileirado com resquícios europeus Vincent Cassel realmente embarca de corpo e alma na tarefa de interpretar os altos e baixos na vida de um artista, e por esse lado, Gauguin, seu personagem, aparenta sofrer mais perdas do que ganhos. Com um visual sujo e decadente por quase todo filme, pouquíssimos momentos entregam ao artista a dignidade que o público espera, sempre transitando em vagos momentos de lucidez e loucura extrema, sua humanidade só acaba sendo apercebida quando o trabalho, pelo qual despeja todo amor, recebe o merecido valor. Nesse contexto, Tehura, interpretada por Tehuï Adams, ganha um papel de mediadora: mesmo sendo a responsável pelas explosões artísticas do marido recebe em troca a hostilidade resultante da genialidade dele. Com pouquíssimos momentos memoráveis o roteiro leva-a a escala de coadjuvante, nevoando sua importância e lhe agregando a mesma presença que os personagens mais descartáveis.

A direção fica por conta de alguém que sabe trazer vida às localidades, Edouard Deluc, que foi responsável pelo filme Mariage à Mendoza (2013) situado na Argentina, sendo que aqui o contexto se repete e é levado ao outro lado do Atlântico. No Taiti, Deluc parece encontrar uma experiência tão bela quanto as telas de Gauguin, a fotografia harmoniosa de Pierre Cottereau entrega imagens de uma terra intocável, numa escala de admiração completa com takes que levam os olhos a passearem por todos os cantos da tela, e dessa forma, fica fácil para o público entender como aquele ambiente é um grande tesouro perto da salobra e metódica vida na cidade. Já a trilha sonora esconde agradáveis surpresas, mas nada que mereça demasiado destaque, a responsabilidade por essa dissidência é de Warren Ellis (seu trabalho foi melhor apresentado em Hell or High Water, de 2016).
Gauguin – Viagem ao Taiti é um balde de água fria, e não me refiro à sua construção, nesse aspecto sua estrutura se segura em uma grande atuação margeada de outras diminuídas e uma direção de arte de tirar o fôlego. Já sua história tem um aspecto crú, algo que eventualmente leigos do mundo das artes plásticas (como eu) não aguardam, o filme é um retrato puramente inibido de fantasias, o que acaba por ser o maior acerto de todo o roteiro, onde se preservam atitudes desumanas e revoltantes que desmistificam a grandiosidade de Paul Gauguin, e consequentemente, da ficcional vida retratada no cinema dos pintores em torno dos anos. Preparem-se para um golpe bem direcionado às suas expectativas.
Título Original: Gauguin – Voyage de Taiti

Direção: Edouard Deluc 

Elenco: Vincent Cassel, Tehuï Adams, Malik Zidi, Marc Barbé, Samuel Jouy, Scali Delpeyrat e outros.

Sinopse: 1891. O artista Paul Gauguin decide, por conta própria, ir para o exílio no Taiti. Lá, ele espera reencontrar sua pintura livre, selvagem, longe dos códigos morais, políticos e estéticos da Europa civilizada. Mas, no local, acaba se afundando na selva, enfrentando a solidão, pobreza e a doença. E deve se reunir com Tehura, que se tornou sua esposa e o tema de suas maiores pinturas.

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