Crítica: Um Lobisomem Americano em Londres (1981, de John Landis)

De todas as combinações de gêneros que o cinema nos permite, a de terror e comédia é com certeza uma das mais interessantes. É engraçado pensar como duas formas essencialmente opostas de se contar uma história, quando combinadas, possam nos trazer obras tão divertidas. É o caso de clássicos como a trilogia Evil Dead, o divertido A Hora do Espanto e um dos meus favoritos: Um Lobisomem Americano em Londres, filme do início dos anos 80 realizado por John Landis, mais conhecido por dirigir comédias como Clube dos Cafajestes e Os Irmãos Cara-de-Pau

A trama já parte ironicamente: seguimos dois amigos americanos, David e Jack, que acabaram de pegar carona em uma caminhonete com ovelhas (entendeu?) enquanto chegam na Inglaterra, para que possam se encontrar com uma garota pela qual Jack está interessado. Ao parar em um pequeno bar e encontrar um pentagrama na parede, que os moradores tratam como se fosse normal, os dois se estranham, porém continuam seu caminho “permanecendo na estrada” conforme foram indicados. Logo após, começam a ouvir uivos e são atacados por um monstro que lembra um lobo.


Com esses primeiros 15 minutos um certo tom já é estabelecido: uma espécie de terror trash, mas com personagens engraçadinhos e situações constrangedoramente cômicas. A atmosfera dessa abertura condiz bastante com a parte de terror, já que até de dia a fotografia é bem cinzenta com o céu nublado (eles estão na Inglaterra, afinal) e a trilha sonora pouco presente contribui com o suspense criado pela locação isolada. Os diálogos são divertidos, contudo fica aquela sensação de que algo dará muito errado na próxima cena, os olhares inquietos dos moradores no bar também não ajudam.

Após o ataque, David acorda em um hospital em Londres e começa a ter alucinações e receber avisos, passa então a desconfiar que possa se tornar um lobisomem na próxima lua cheia. A montagem do filme, um de seus pontos fortes, brinca com essa dinâmica sonho/vida real ao praticamente excluir as transições óbvias e acaba tornando tudo deliciosamente dinâmico: há situações oníricas, porém estas parecem conectadas à essência do roteiro e por isso até conseguem enganar o espectador algumas vezes, um elemento em especial permanece em um ótimo tom de mistério por uma boa parcela da história quanto à sua existência (ou falta dela).

Essa dinamicidade é encontrada também no desenrolar da narrativa, a obra nunca se arrasta; o ritmo da edição e do roteiro são muito bons. Até na barriga criada entre o primeiro ataque de lobisomem e a transformação do protagonista o filme nunca deixa de entreter graças à comicidade dos personagens e do principal elemento humorístico da história, evidenciado pelo título: a situação de peixe fora d’água de David na Inglaterra. O roteiro abusa dos esteriótipos para criar piadas relacionadas a nacionalidades até com um certo grau de racismo (uma incluindo um empregado do hospital é particularmente interessante) e diferenças de pensamento entre americanos e ingleses; pode parecer repetitivo, porém o filme consegue sempre encontrar novos meios de se divertir com sua locação (“Shakespeare era francês!”).

Infelizmente, tal velocidade da narrativa e foco na diversão trazem alguns custos: há diversos elementos subdesenvolvidos e o roteiro não é muito ambicioso em relação a seus personagens, tanto é que nenhum dos protagonistas tem um arco definido. Fica bem óbvio que o único objetivo da obra é entreter, qualquer parte da história que não possui muito a oferecer nesse quesito não é muito explorada: uma subtrama envolvendo o médico investigando a vila da abertura do filme é muito corrida, o romance entre David e sua enfermeira fica bem forçado e o arco do objetivo original dos amigos no país é concluído de forma tragicômica com apenas uma frase.


Por outro lado, a estrutura de 3 atos da obra é muito bem definida e permite até um certo contraste muito satisfatório entre as partes: o primeiro se trata do ataque a David e seu questionamento sobre se isso está realmente acontecendo ou não, o segundo trabalha bem a relação entre o protagonista e sua transformação e o terceiro joga tudo pro alto e vira um monster movie clássico. É aqui que o nível de humor negro é elevado à enésima potência, o que era um filme divertido se torna um deleite para os olhos com um uso lindo de efeitos práticos para representar a violência extrema quase cartunesca dos ataques. Alie isso ao uso dramático de luz, uma divertida câmera subjetiva e atuação gritante dos figurantes e os últimos minutos do filme se tornam seus melhores, de longe.

Um Lobisomem Americano Em Londres é um filme muito inteligente e eficiente naquilo que se propõe: entreter. Não é necessariamente uma obra-prima do terror ou um clássico indiscutível, porém sua mistura de humor, violência e um ritmo muito prazeroso o transformam em uma obra divertidíssima. Não aprofunda muito seus temas ou personagens, mas nem precisava; ironicamente, seu final anti-climático é a maior prova disso.


Título Original: An American Werewolf in London

Direção: John Landis

Elenco: David Naughton, Jenny Aguter, Griffin Dunne, John Woodvine, Lila Kaye.

Sinopse: Dois estudantes de Nova York vão a Londres a passeio e chegam ao bar de uma pequena cidade sinistra. Saindo do local, são atacados por uma horrenda criatura. Um morre e o outro sofre apenas alguns cortes, o suficiente para que vire um lobisomem.

Trailer
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