Crítica: 007 – Contra o Satânico Dr. No (1962, de Terence Young)


007 – Contra o Satânico Dr. No é o primeiro filme daquela que viria a ser a franquia mais famosa do cinema, que completou 50 anos em 2012. Baseado no livro homônimo de Ian Fleming, foi responsável por dar um rosto ao agente 007 e torná-lo mundialmente conhecido.


Em Dr. No é contada a primeira aventura do famoso agente, que é designado a investigar o assassinato de outro agente. James Bond (Sean Connery) viaja então para a Jamaica, onde descobre que o colega assassinado esteve investigando as atividades do misterioso dono da ilha de Crab Key, que atende simplesmente pelo nome de “Dr. No”.

É neste primeiro filme que conhecemos as idiossincrasias do agente, elementos tão importantes da sua personalidade que voltariam a se repetir nos filmes seguintes, como uma marca registrada. Ainda que os atores a interpretá-lo mudassem com o passar dos anos, características como: charme, lábia irresistível para as mulheres, personalidade forte, humor sarcástico e cínico e elementos como a célebre frase de apresentação (“Bond, James Bond”), a bebida favorita do agente – vodka Martini (batido, não mexido) – e a famosa trilha sonora composta por Monty Norman acompanharam o personagem fielmente nestes 55 anos.
Além destas características do comportamento e atitude do agente, Dr. No apresentou James Bond com um sofisticado gosto por arte, assim como pelos carros que dirige – modelo Aston Martin – e sem muitas parafernálias: uma pistola automática (modelo Walther PPK) e boas habilidades de luta.


De fato, neste primeiro filme as cenas de ação não são muitas. A maioria delas mostra o agente exercendo seu lado investigativo, apurando fatos e identificando as armadilhas do inimigo, além de mostrar a sua perspicácia ao deduzir a verdade. Entretanto, as cenas de perseguição são muito bem filmadas, especialmente considerando a época. Destaque para a chegada de Bond à Jamaica, quando sai do aeroporto e um motorista o intercepta; outro momento de perseguição muito interessante é quando Bond é seguido ao se dirigir ao apartamento da secretária chinesa Miss Taro e quando explode a fortaleza do vilão que dá título ao filme.
Ademais, outras cenas marcantes do filme, não propriamente de ação, mas pela sua qualidade e pelo trabalho dos atores, são a sequência em que Bond encontra uma tarântula ao seu lado no travesseiro, em que o suspense da cena é cuidadosamente crescente, fazendo o espectador suar frio com a personagem, até o momento em que ele calma e habilmente consegue abater a ameaça – enquanto a trilha musical marca as sapatadas com as quais se defende do aracnídeo.

O encontro de Bond com o Prof. Dent está entre as cenas que merece um destaque especial. No bangalô de Miss Taro, onde esperava pela chegada do inimigo, o agente enrola lençóis na cama e fica à espreita atrás da porta. Ao chegar, Dent logo dispara seis tiros nos lençóis, caindo na armadilha preparada por Bond, que o surpreende e o interroga. Logo depois Dent recupera a arma que deixara cair e imediatamente dispara na direção de Bond, mas a arma está descarregada. Então Bond comenta, sabiamente: “Esta é uma Smith & Wesson, e você já deu os seus seis (tiros)”, antes de atirar de volta.
A icônica cena de Ursula Andress, a primeira Bond girl, saindo do mar trajando apenas um biquíni branco e uma faca presa à cintura, no primeiro encontro entre Honey Ryder e James Bond, ficou marcada no imaginário do público masculino por gerações, sendo Andress a Bond girl preferida de muitos até hoje. O mesmo biquíni usado nesta cena, inclusive, foi arrematado por US$ 60 mil num leilão realizado em 2001.

Também as Bond girls são um elemento característico do universo 007, cuja tradição começou com Dr. No. Neste primeiro filme, Ursula Andress deu vida a um mero objeto de conquista; sua personagem não tem muita importância para o desenrolar da trama em si, apesar de ter presença em cena e carisma, além de demonstrar independência e esperteza, algo de exótico a seu respeito (apresenta-se como uma caçadora de conchas) e um nome, no mínimo, peculiar (Honey Ryder). A maioria destas características do comportamento e atitude da primeira Bond girl seria perpetuada nas que a sucederam.
A fama de sedutor, atribuída ao charme com o qual Sean Connery, o primeiro a interpretar Bond, praticamente batizou a personagem, é atestada logo na primeira cena do agente, em que ele joga cartas no cassino do hotel com uma mulher elegante. Seu rosto ainda não está enquadrado na cena, apenas a voz, enquanto ele faz um gracejo sobre a ousadia da mulher em insistir no jogo, apesar de estar perdendo. Ele diz “admiro sua coragem, senhorita…” – ela então responde “Trench. Sylvia Trench. Admiro a sua sorte, senhor…”, dando a famosa deixa quando então o rosto de Connery é finalmente enquadrado na cena ao responder “… Bond. James Bond”.


Logo após este primeiro diálogo entre os dois, Sylvia Trench está visivelmente atraída por Bond. E apesar da pequena participação da atriz Eunice Gayson, a ideia inicial era que a sua personagem fosse recorrente no filme, sempre se envolvendo com Bond. A mudança em relação a sua participação deve ter sido motivada para levar o público a diferenciar encontros amorosos casuais de Bond do envolvimento com a Bond girl. No entanto, Gayson voltaria no ano seguinte, em Moscou Contra 007.
Depois de ser apresentado ao público logo na primeira aventura romântica de Dr. No, Bond recebe o chamado de “M”, chefe do MI-6. Ao chegar no escritório de “M”, Bond faz gracejos com a secretária, conhecida apenas por Miss Moneypenny, demonstrando mais uma vez sua lábia natural para encantar as mulheres. Esta relação com Miss Moneypenny, por sua vez, que insinua certa atração sexual entre os dois, também foi mantida tradicionalmente nas sequências da franquia.


Connery, apesar de parecer ter nascido para o papel, não foi a primeira escolha do diretor e produtores. Terence Young sugeriu o ator Richard Johnson, que estrelou diversos filmes ingleses nos anos 1960; o produtor Harry Saltzman, assim como o autor dos livros, Ian Fleming, preferiam Roger Moore (que viria a ser 007 no futuro), o qual estava indisponível à época. Connery, que ainda estava no início da carreira, foi sugerido pela esposa do produtor Albert Broccoli e apresentado por Ben Fish, amigo do diretor Peter R. Hunt.


Foi a partir de Dr. No que James Bond tornou-se referência de cidadão inglês, com estilo requintado e pronúncia inglesa “poshed”, elegante. A questão da pronúncia inglesa foi tão importante, de fato, que as vozes femininas do filme foram dubladas por atrizes inglesas – à exceção de Lois Maxwell, que interpretou Miss Moneypenny em 14 filmes da franquia (e a quem foi inicialmente oferecido o famoso papel da Bond girl), cuja voz foi mantida.
Tão importante quanto o protagonista, os vilões da franquia 007 costumam estar à altura de Bond, principalmente em raciocínio lógico e habilidades de luta, e representar um grande desafio para o agente. No entanto, este é outro aspecto importante que não funcionou muito bem no primeiro 007. Dr. No, quando finalmente aparece em cena, após muito suspense acerca das misteriosas atividades na ilha de Crab Key, revela-se pouco intimidador; o vilão recebe Bond cordialmente, oferecendo-lhe um jantar e mostrando-se um pouco irritadiço apenas quando o agente faz algumas piadinhas sobre o seu grande plano de acabar com o programa espacial americano. O máximo que faz contra Bond é prendê-lo numa cela, da qual ele sai facilmente por uma passagem na tubulação.


Assim, o vilão, que poderia desempenhar um papel tão importante quando o do protagonista, quase que passa despercebido pelo filme. O mistério de Dr. No permanece um mistério. É revelado o que ele pretende e o motivo, mas geralmente boa parte do passado do antagonista, justamente o que dá sustentação aos seus planos diabólicos em outros filmes, aqui também passa despercebido. Desta forma, não há um grande confronto entre protagonista e antagonista, o que em filmes futuros representaria bons momentos finais e mais interessantes.
Contudo, se o Dr. No deixou a desejar como vilão, outros atores compensariam nos filmes seguintes. Assim como as sequências de ação passaram a ser mais numerosas e James Bond passou a ter mais aparelhagens técnicas que se revelaram de grande auxílio em momentos de sufoco e as Bond girls deixaram de ser somente um objeto de conquista. Mas as aventuras seguintes devem a Dr. No por ter aberto as portas dos cinemas para James Bond e lançado as bases para que suas histórias pudessem ser contadas durante estes 55 anos.


Título Original: Dr. No

Direção: Terence Young

Elenco: Sean Connery, Ursula Andress, Lois Maxwell, Eunice Gayson, Joseph Wiseman, Bernard Lee, Anthony Dawson, Robert Rietty, Jack Lord.

Sinopse: James Bond (Sean Connery) é enviado ao Caribe para investigar o assassinato de um outro agente e acaba esbarrando no dr. No (Joseph Wiseman), um diabólico e inescrupuloso cientista chinês. Dr. No montou um esquema para desviar todos os mísseis lançados pelos Estados Unidos e pretende cobrar caro para recolocar as armas nas rotas previstas.
Trailer:


E você, o que acha do primeiro filme de 007? Deixe seu comentário! 🙂

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