Crítica: Corrente do Mal (It Follows, 2015, de David Robert Mitchell) – O melhor terror de 2015!

Você já assistiu a todo tipo de filme de terror que poderia ver, correto? Já viu assassinatos em série, com loucos mascarados ou canibais. Já viu filmes que se passam em cabanas, mansões, no espaço, na lagoa, etc. Filmes de tortura e em albergues. Ou quem sabe aquele filme de assombração, exorcismo, zumbis, etc. Vários destes por trás das câmeras como um falso documentário. A verdade, meu amigo leitor, é que o gênero do terror é o mais copiado e numericamente feito no mundo dos filmes, que não atinge apenas o cinema, mas lotam os DVDs e sites de filmes online. Este excesso gerou uma marginalização no gênero. Portanto temos um quadro onde o gênero mais feito no cinema, um dos percursores da sétima arte, é ao mesmo tempo o mais rejeitado e criticado atualmente. Diante deste cenário, fica difícil imaginar um filme de terror de qualidade, que tenha um bom roteiro e tenha a ousadia de ser original. Felizmente de tempos em tempos recebemos um raro exemplar que brinda o público mais exigente, que procura um terror mais sólido. E é com prazer que digo que os cinéfilos poderão conferir neste ano um dos melhores filmes de terror feito em muito tempo. E este filme é It Follows, que no Brasil recebeu o nome clichê de Corrente do Mal. Mas apesar de clichê, o nome faz sentido. A estreia acontece por aqui apenas em 23 de Julho, mas o Minha Visão do Cinema traz com exclusividade a crítica deste incrível filme.

Como o título original sugere, trata-se de algo que te segue. E segue mesmo! Este já é o terror do ano, pelo menos o mais comentado e elogiado até então, com uma aprovação de 95% da crítica, uma das notas mais altas do ano. O filme que custou apenas US$ 2 milhões e já arrecadou mais de 15 milhões de dólares somente nos Estados Unidos é uma pequena pérola deste ano. Até um continuação já está encomendada. Mas depois de tanta propaganda, o que este filme tem de especial afinal? O roteiro! Fugindo dos clichês citados no primeiro parágrafo, o filme aposta numa nova situação, um novo parâmetro do terror, sendo possivelmente o primeiro do seu sub-gênero. Na trama conhecemos uma jovem com seus sonhos e temores típicos. Após ficar com um rapaz, este mesmo cara a amarra e explica que ele passou algo para ela na relação íntima. Ele passou um mal, uma maldição (uma corrente maligna), onde algo não explicado mas apavorante irá seguir ela. E se tocar nela, a morte é certa. A única maneira de se livrar disto é fazendo sexo e passando a maldição adiante.

Nesse momento o filme assumi um clima psicológico perturbador, onde vemos a jovem ser perseguida por esta força maligna. Sem exageros, mortes violentas ou correria, o filme inteligentemente constrói o terror de maneira lenta, sutil e instigante. Vemos a “coisa” seguindo a jovem sempre de longe, da perspectiva dela, que tenta escapar da situação. Logo os amigos e vizinhos tentam ajudá-la, mas dão-se conta de que só há uma maneira de se livrar: passando adiante. A ideia de uma assombração sexualmente transmissível é inteligentíssima, original e dá um vigor na nova geração do terror. Um ponto interessante é o fato do filme lidar com a sexualidade de maneira séria, sem apelar. Não há sexo explícito ou cenas pesadas. Não são jovens estilo American Pie. Tudo é tratado de maneira implícita, com o “pé no chão” e com respeito. É uma situação tórrida e o filme mostra isso de maneira psicologicamente amedrontadora.

A direção é certeira, com momentos que até parecem amadores, mas é para mostrar o ponto de vista da pessoa que está sendo seguida pela “coisa”. O jovem elenco se sai razoavelmente bem, algo difícil para filmes de terror com adolescentes. O destaque é mesmo da protagonista, que não é a típica mocinha loirinha e burra. A bela atriz Maika Monroe se sai bem e torna-se uma das revelações do ano. Destaque para a fotografia e direção de arte, que trazem cenas em campo aberto, paisagens como na praia e detalhes dos interiores das casas; tudo feito de maneira bem cuidada e bonita diante as câmeras. A edição torna o filme intenso, mesmo que com uma história contada de maneira lenta. A edição de som ajuda na ambientação da trama. Não há aqueles sons altíssimos quando algo aparece, como acontece na maioria dos filmes de terror. Aqui há sim sons que te deixam nervoso, mas na maioria das vezes é um trabalho sonoro alternativo, com canções e notas bem indie e que lembram filmes antigos dos anos 70 e 80.

Não irei negar, é um filme para poucos. É um filme de poucos recursos, não há ação, efeitos especiais e gritaria. Tem uma pegada indie, é um filme independente e de cunho artístico. A construção do terror é lenta, onde o que perturba não são cenas fortes, mas a situação estranha em si. Mas qualquer estranheza que você inicialmente possa sentir é compensada com um belo roteiro. Há momentos bonitos, como quando a protagonista se arruma na frente do espelho. Há um forte drama psicológico inserido no meio do filme, como pensamentos de remorso. E o melhor é a grande metáfora que o filme é. A presença maligna que persegue a jovem pode facilmente ser associado às doenças sexualmente transmissíveis, que perseguem e matam milhões ao redor do mundo. Inteligentemente o filme faz-nos refletir nas vítimas das DSTs e o quanto deve ser apavorante ser perseguido e saber que irá morrer. E é nesse quesito que o filme se torna assustador. É o terror, é a fantasia, é a arte imitando a vida.

Corrente do Mal é um dos poucos filmes de 2015 que realmente é imperdível. Mas vá preparado para assistir algo fora do comum, algo alternativo e até mesmo estranho. Mas assista-o, pois assusta e ao mesmo tempo é belo. Tem um clima intenso, uma trilha sonora incrível, cenas horripilantes e é uma grande novidade. Há algumas coisas inexplicáveis, como a cena da piscina. Tenho minhas teorias do que aquilo e o filme todo quiseram dizer. Mas pararei por aqui. Assista e tire suas próprias conclusões. O filme tece uma linha com a realidade e por isso é tão assustador. Nada assusta mais do que a realidade. Ainda mais quando sabe-se que morrerá. Esta obra de arte realmente é imperdível. E após ver este filme, você ficará com a sensação de que algo te persegue.

Direção: David Robert Mitchell

Elenco: Keir Gilchrist, Carollette Phillips, Loren Bass, Olivia Luccardi, Lili Sepe, Maika Monroe, Jake Weary, Daniel Zovatto.

Sinopse: A jovem Jay (Monroe), de 19 anos, leva uma vida tranquila, se dedicando aos estudos, paqueras e fins de semana no lago. Mas depois de um encontro sexual aparentemente inocente, ela se vê atormentada por estranhas visões e um sentimento constante de que alguém ou algo está a seguindo. Diante deste fardo, Jay conta com a ajuda dos amigos para encontrar uma maneira de escapar dos horrores que parecem estar a poucos passos de distância.

Trailer:


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